quarta-feira, 24 de março de 2010

O PECADO ORIGINAL


18-03-2010 - Genesis 2, 17

O pecado original é a representação de todo o sofrimento humano, o qual surgiu na origem dos primeiros homens e que vem sendo, desde então, transmitido de geração em geração.
Estudar o sofrimento humano já é algo bastante complexo mas, tratar de um pecado hereditário, é ainda mais.
“Por que justiça eu deveria sofrer por um pecado que eu não cometi?” Esta talvez seja a pergunta que tira toda a lógica desta ideia. Por isso é um assunto tomado de polêmica e intrigas.
Na doutrina cristã o pecado original procura explicar, pela existência do mal, toda imperfeição humana e o seu sofrimento. O livro de Gênesis, cuja autoria foi atribuída a Moisés pela tradição judaico-cristã, conta que os primeiros humanos, representados por Adão e Eva, foram advertidos por Deus que, de todas as árvores do paraíso, “somente o fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal não poderia ser provado”, cuja consequência para quem o fizesse seria a morte. No entanto, tendo sido tentada pela serpente, Eva provou deste fruto e convenceu Adão a também provar e, pela desobediência, a morte se instalou no homem e assim eles foram, sumariamente, expulsos do paraíso.
Ainda não se tem uma interpretação objetiva e definitiva a respeito desta doutrina, já que foi escrita de forma metafórica e não há em toda a escritura sagrada o esclarecimento do que consiste este pecado.
Tem-se, como conceito cristão, que a morte de Jesus, mesmo Ele não possuindo pecado algum, ocorreu para a remissão do pecado de origem que é de todos. E que, Maria foi gerada livre de qualquer pecado, conforme o dogma, da Imaculada Conceição, atribuído pela Igreja Católica Romana. Por este motivo, ela é chamada “cheia de graça”.
Gênesis fala de um pecado do conhecimento, ou pecado da ciência, conforme a tradução da escritura. Mas, analisando ainda mais especificamente, considerando o termo “fruto do conhecimento do bem e do mal”, pode-se também dizer do pecado do julgamento.
Pensar num pecado certo, inevitável e imutável seria a negação do perdão de Deus e da salvação oferecida por Ele. Por certo não foi esta a mensagem transmitida pela Escritura. Mas então, o que poderia significar este pecado? E como agir para evitar que os seus efeitos impeçam a busca pela salvação e pela “vida em abundância” que Deus nos dedicou?
Bem, se ainda não há esclarecimento, creio que podemos especular...
1 - Se considerarmos que o alerta do pecado original diz respeito ao conhecimento e à ciência, talvez o texto faça menção ao agir do homem tomando por base a condição humana, de acumular conhecimento e ciência.
Ao homem, Deus permitiu a razão, ou seja, a capacidade de pensar, processar informações e acumular conhecimento. A ciência é atributo humano e, por ela, muito se pode realizar. Porém, a realização desta ciência só produz bons frutos se balizada pela sabedoria, que é atributo exclusivamente divino.
O conhecimento e a ciência não libertam, a sabedoria sim. Porque o conhecimento e a ciência podem mostrar uma falsa verdade que só se revelará falsa pelas consequências indesejadas. Assim, não basta acumular conhecimento pelo uso da razão se não há a sabedoria para o bem utilizar destes recursos.
Para que a sabedoria possa realizar-se na vida, o homem deve estar em plena sintonia com Deus, porque ela não consiste em algo que possa ser acumulado. A sabedoria utilizada hoje não surtirá efeito amanhã.
Assim pensava Santo Agostinho, que acreditava que o dom da ciência foi dado ao homem para que dependesse exclusivamente dele a sua própria salvação.
O apóstolo Paulo já disse: “a letra mata, mas o espírito vivifica”... “ainda que eu falasse a língua dos anjos e dos homens, sem amor eu nada seria … e ainda que tivesse o dom da profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de maneira tal que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada seria”. É o mesmo que dizer: ainda que eu tivesse todo o conhecimento e toda a ciência, sem sabedoria, nada seria. Porque a sabedoria se manifesta pela prática do amor, cuja fonte é Deus.
Por esta ótica, pode-se afirmar que agir somente conforme o conhecimento e a ciência do homem, sem a sabedoria de Deus, consiste num pecado de origem. É iniciar uma caminhada erroneamente, portanto, para um destino igual inconsistente.
Adão e Eva passaram a agir conforme os seus conhecimentos, deixando de lado a sabedoria, por isso, passaram a se sentirem nus e sem a coragem necessária para estarem face a face com Deus.
2 – De outro modo, se considerarmos que seja um pecado de julgamento, o pecado original pode alertar sobre o sofrimento consequente do uso do julgamento, pelo homem.
O julgamento humano é o pai da mágoa e do rancor, que afligem, porque é de onde surgem a incompreensão e a intolerância e, por ele também, ocorre a corrupção da essência divina que habita no homem.
Jesus alertou que “quem julgar será igualmente julgado”.
Deus criou o homem e os seus sentimentos, mas do uso indevido do julgamento autônomo, o homem inventou o ressentimento, ou seja, a mágoa.
Julgar é permanecer preso no passado; preocupar-se, no uso do conhecimento e da ciência, é permanecer preso no futuro; sendo que o “paraíso” está no agora.
Talvez esteja nesta alusão a afirmação de que o homem e a mulher foram expulsos do paraíso após cometerem o pecado original.
Neste contexto, Francisco de Assis foi o modelo, de quem fez valer a morte de Jesus, para a remissão do pecado original. Aproximou-se muito dos animais e quase se tornou um deles em pureza, considerando que abdicou-se do uso da própria razão e do julgamento humano, deixando assim, prevalecer a sabedoria de Deus em todas as suas atitudes.

Nunes

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